Quando eu morrer

 

1. 


Já escutei muitas pessoas dizendo estas três palavras mágicas “Quando eu morrer”. Muitas das vezes falam quando estão de barriga cheia. Será que dá para levar isso a sério? Não se sabe! Alguns levam mesmo a sérios e outros são os copos ou a comida falando. Salve algumas figuras na história de humanidade como o Mestre dos mestres que falou sobre Sua morte com um espírito sereno, o homem do discurso I have a Dream, que falou sobre a sua possível morte, justamente porque vinha recebendo ameaças, e no dia seguinte levou um tiro.

Sobre a nossa morte não sabemos como será, não há uma forma padrão de morrer, cada qual tem a sua morte. Fico muito confuso quando alguém morre e corremos para as redes sociais, postar a foto da pessoa e, na legenda escrevemos: “Foste sem dizer adeus” ou “Estive contigo ontem não sabia que não iria ver-te mais” será que não sabemos que cada morte é uma morte? Não foi à toa que Tabasily canta “A kufa a vhavalelisi, swifana na djoni la ku fohla[1].Escrevemos como se fosse uma obrigação do ente-querido que nos dispeçamos, escrevemos porque queremos sair na fita como quem se solidariza com a família enlutada mesmo sem termos conhecido a pessoa, simplesmente descarregamos as fotografias nas redes sociais e buff, publicamos. Não sei se isso nos deixa solidários ou insensíveis, porque aos que perderam de verdade, pode ser doloroso todas as vezes que usarem as redes sociais se depararem com as nossas falsas propagandas cheias de hipocrisia.

 Só sei que quando eu morrer não gostaria que me postassem, eu não gostaria, e nem os meus familiares e amigos achariam isso, algum tipo de solidariedade. Só sei que quando alguém morre não precisa de ser postado. Só sei que os discursos longos cheios de muita hipocrisia são inúteis nos funerais. Só sei que muitos que se fazem de amigos do ente-querido são os primeiros que não o apoiavam quando ainda vivo. Só sei que dos familiares nem todos sentem a perda e para alguns é alívio. Só sei que uma vez que morrermos vão se esquecer de nós e do que fizemos durante a peregrinação aqui na Terra. Só sei que vão nos chorar durante o processo de sepultamento, depois que o nosso corpo beijar a terra vão tomar chá às gargalhadas. Só sei que no sétimo dia depois da nossa partida será mais um dia de reencontro para tomar Maheu[2] e comer arroz com feijão e carne de vaca. Só sei que depois de alguns anos farão festas em nome de “15 anos de eterna saudade” e vão comer muito bem. Só sei que todos morreremos, só não sei quando e como, cada qual tem o seu dia e o seu modo de morrer.

In Efeitos da Quarentena



[1]Morrer é um acto que dispensa despedidas, é como uma viagem ilegal à África do Sul. (Julga-se que ao despedir-se sem passaporte, os parentes não te deixem partir).

[2] Sumo de farinha

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